terça-feira, 5 de julho de 2011

Exame de Ordem e o 'Dilema de Tostines'






O meio jurídico brasileiro discute nas últimas semanas, com rara intensidade e inédita repercussão nos mass media, as estatísticas de aprovação dos bacharéis em Direito no chamado exame de Ordem, com o que se podem habilitar à inscrição nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB.

O blog de Marcelo Hugo da Rocha, por exemplo, pôs o tema em pauta há dois dias, com matéria intitulada 'OAB reprova 9 em cada 10 bacharéis', perfilhando, ao que parece, a cediça posição adotada pela Ordem a respeito do problema, que reenvia a questão exclusivamente ao anoso deficit de formação dos bacharéis em Direito no País.

A questão, porém  para além da discussão concernente ao cabimento e à legitimidade do exame de Ordem, que nesta oportunidade deixo de entabular , não me parece tão simples quanto querem fazer crer dirigentes da Ordem dos Advogados e boa parte de seus filiados, além da generalidade da grande imprensa. 

É indiscutível, por um lado, o evidente despreparo que revelam os bacharéis recém-saídos de nossas faculdades de Direito, sobretudo aquelas surgidas no ambiente de
descontrolada expansão da educação superior no Brasil, iniciado de forma inconseqüente e irresponsável em meados da década de 1990.

É igualmente certa, por outro, a notória e insuperável incompetência da OAB em produzir um exame de boa qualidade e isento de distorções, capaz tanto de aferir a formação geral dos bacharéis, no sentido de sua aptidão para o exercício da profissão de advogado, como de escoimar-se definitivamente de vícios tais como a 
histórica promiscuidade com o segmento dos famigerados 'cursinhos' preparatórios, muitos dos quais mantidos, com inacreditável desfaçatez, por dirigentes da própria instituição.

Em suma, se os candidatos têm em sua maioria e quando muito uma formação sofrível, melhor qualificação não merece o próprio exame a que são submetidos, composto de questiúnculas e de proposições capciosas, defeituosamente articuladas e precariamente redigidas, muitas das quais mal podem ser interpretadas e resolvidas mesmo por notórios especialistas nas respectivas áreas.

Daí que não seria sem lugar, nas tentativas de explicação dos repetidos fiascos no dito exame de Ordem, a astuciosa questão posta na forma do Dilema de Tostines, celebrizado por uma velha campanha publicitária: "Vende mais porque é fresquinho ou é fresquinho porque vende mais?"

Menos ainda se pode responder com segurança, na contenda que a propósito dos desastrosos resultados se estabelece entre a Ordem dos Advogados e o Ministério da Educação, quem ou o que está mais fora do eixo da razão. 

Assim segue a OAB, que insiste em desafiar os candidatos com seus exames cada vez tanto mais complexos quanto qualitativamente ruins, os quais apontam para a total falta de clareza quanto ao viés de seleção adotado, desmoralizando-se pelos próprios resultados, sobretudo quando reprova em massa também os bacharéis egressos de instituições de induvidosa qualidade.

Assim o MEC, à frente de todo o sistema estatal de supervisão e regulação da educação superior, que permitiu a instalação e se vê na contingência de tolerar a sobrevivência das fábricas de produção em série de bacharéis em que se converteram, ou foram concebidas ab ovo, as faculdades de Direito que pululam em cada esquina no País.

Qualquer seja o ângulo pelo qual se veja, o quadro é desolador. E não se explica, nem se resolve, com recurso ao 
proposital simplismo conceptual adotado pela OAB e pelos prosélitos do famigerado exame.




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