terça-feira, 24 de janeiro de 2012

"É aqui que eu amo"? Ah, que saudade das Casas Pernambucanas!


Sou do tempo em que "as Casas Pernambucanas é que vão aquecer o meu lar" — dito assim mesmo, coloquialmente —, segundo um reclamo embalado por simples e inesquecível melodia.

Ultimamente, porém, vejo-me sujeito a ouvir pela televisão rumorosos brados que exorbitam o aceitável, mesmo para a mera linguagem coloquial: "a Casas Bahia vende pelo menor preço", ou coisa que o valha. A despeito da possbilidade de se vislumbrar, no caso, uma ficta concordância via presuntiva silepse, formulações como essa me ferem dolorosamente a sensibilidade, visto que soam, sob todos os aspectos, muito pouco canônicas e ainda menos eufônicas.

Há não muito, um representante da poderosa indústria norte-americana do petróleo no Brasil costumava, além de praticar suas costumeiras investidas contra o meio ambiente, agredir também o idioma pátrio local. Anunciava-se por aqui, em variados media, que o produto Texaco Havoline seria "o óleo que você confia", em aparente demonstração de completa ignorância das mais elementares regras de regência verbal da língua portuguesa.

Na mesma linha de desvio da norma culta, diz uma empresa coreana que One Touch é "a linha de impressoras e multifuncionais Samsung que você nunca sonhou". Uma vez mais, às favas a regência verbal. Para meu desgosto, vim a descobrir-me dono de um aparelho dessa marca, mais precisamente dessa linha de produtos. Boa máquina, de fato. Mas provavelmente teria resistido ao impulso de compra, conhecesse de antemão o famigerado slogan.

Nos dias que correm, por seu turno, é a administração municipal da terceira maior cidade do País, Belo Horizonte, que — em meio aos trágicos efeitos do caos instaurado pelas precipitações de verão, com o que a capital mineira se inscreve, em definitivo, entre as tantas metrópoles brasileiras vergonhosamente despreparadas para esses previsíveis fenômenos meteorológicos — segue a veicular na televisão irritante campanha publicitária, igualmente atentatória contra o vernáculo. Ao custo de milhões para o contribuinte, entoa-se insistentemente um refrão que principia com "é aqui que eu amo", em acordes neo-caipiras de duvidosíssimo gosto, embora com seguro desacerto gramatical. Acaso desconhece a municipalidade, ao reproduzir a abstrusa linguagem dos autores da paupérrima canção, que um advérbio de lugar não poderia jamais, sob pena de truncar a estrutura frasal, figurar como impróprio objeto direto?

Descuido, despreparo, desleixo, ignorância ou proposital mimetismo do falar do vulgo, pouco importa a razão. Empresas, administradores públicos, músicos e publicitários, mediocrizados ou acumpliciados entre si, são todos igualmente responsáveis por esses sistemáticos e criminosos atentados ao patrimônio cultural representado pelo idioma.








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